Apoena bioindustrial transforma a vida de comunidades tradicionais e avança no mercado de bioativos com apoio do BNDES Garagem 2024

A Apoena Bioindustrial tem um propósito: fazer do coco babaçu um valioso ativo da sociobiodiversidade brasileira, gerando renda e condições mais justas para as mulheres que trabalham com a extração do fruto em comunidades no norte do país. Com sede no município de Coroatá, no Maranhão, o negócio foi um dos 100 selecionados para o BNDES Garagem 2024, programa gratuito de apoio a empreendedores e startups comprometidos com a resolução de desafios socioambientais, realizado em parceria com o Quintessa. Com a aceleração, a empresa planeja consolidar um dos produtos do seu portfólio, um aditivo natural capaz de diminuir o consumo de combustíveis fósseis em até 15%, contribuindo para a redução da emissão de monóxido de carbono (CO2).
O projeto da Apoena é fortalecer a venda do aditivo para a indústria de automóveis, abastecendo principalmente a frota de veículos e máquinas agrícolas, que melhor respondem ao uso do produto biológico. “Descobrimos que os motores de rotação constante, como o de tratores e colheitadeiras, apresentam o melhor rendimento para o nosso produto. Temos um nicho de mercado para o aditivo”, explica Márcia Werle Apoena, CEO da empresa.
Durante a primeira fase do BNDES Garagem, a empresa participou de três importantes conversas com cooperativas agrícolas, foco da etapa atual de expansão dos negócios, e avançou em um MVP (produto mínimo viável) com um cliente em potencial. Com a lente voltada para a geração de oportunidades, o programa reafirma a importância de construir produtos competitivos e com planos estruturados antes da ida ao mercado. “Não basta ser um negócio de impacto. O produto precisa ser competitivo. Esse foi o principal aprendizado adquirido com as mentorias do programa ao longo da primeira fase do BNDES Garagem”, afirma Márcia. Em 2025, a empresa planeja abrir uma segunda planta para processamento do babaçu, no Mato Grosso, aproveitando os incentivos fiscais do Estado e o potencial de mercado do agro local.
Integrante da categoria Economia verde e descarbonização, responsável pela maioria dos inscritos no BNDES Garagem 2024, a Apoena atua em um mercado que pode chegar a dois trilhões de euros e gerar 22 milhões de empregos em todo o mundo, segundo dados da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD). Com um modelo de produção baseado no uso de recursos biológicos, a bioeconomia tem potencial para otimizar o uso dos recursos naturais do Brasil em prol da produção de alimentos, fibra, energia, prestação de serviços ambientais e ecossistêmicos, química verde e outros insumos.
Coco babaçu – um fruto polivalente:


A Apoena trabalha com o processamento integral do babaçu. Do fruto, tudo é aproveitado: das castanhas se faz óleo; do mesocarpo – a parte branca do babaçu -, a farinha; da casca o carvão in natura, para ser queimado em fornos; e da mistura do mesocarpo com a farinha, um suplemento alimentar para animais. A empresa atua ainda no desenvolvimento de um carvão ativado e apoia a pesquisa de um aluno de doutorado que busca utilizar o epicarpo do babaçu – a fibra dessa planta como matéria-prima para a produção de um adubo orgânico.
Todos os itens são processados em uma máquina industrial, especialmente desenvolvida pela empresa para melhorar as condições de renda e trabalho das quebradeiras, além de aprimorar a cadeia de valor do fruto, aumentando o potencial de mercado do ativo ambiental. A Apoena compra o babaçu diretamente das comunidades tradicionais, sem atravessadores. As mulheres são remuneradas pela venda do coco inteiro, sem necessidade de passar de oito a dez horas por dia quebrando o fruto para comercialização. Neste modelo de negócios inclusivo, as quebradeiras conquistam em dois dias o que antes alcançavam com um mês inteiro de muito trabalho. Além da redução expressiva do tempo dedicado à atividade, as famílias registram um incremento médio de 30% na renda mensal.
A mecanização do processo de coleta e extração dos produtos do babaçu contribui para a profissionalização de toda a cadeia de valor do fruto. O processamento industrial facilita a padronização e a distribuição da matéria-prima ao mercado, evitando quebras de fornecimento e dificuldades na entrega ainda comuns à cadeia do babaçu. “É preciso ter um negócio mais estruturado para que as empresas realmente desenvolvam produtos a partir do babaçu, como já acontece com o açaí ou com o cacau, dois frutos nativos com mercado consolidado no Brasil e no exterior”, explica Márcia.
Desde que chegou ao mercado, em 2019, a Apoena já processou 228 toneladas de coco babaçu, ajudando a preservar mais de 90 hectares da Mata de Cocais, vegetação de transição entre três biomas ameaçados do país – a Caatinga, o Cerrado e a Floresta Amazônica. Cerca de 30 famílias fornecem o fruto para a Apoena, e três mulheres da comunidade trabalham na fábrica, contribuindo diretamente para a transformação da cadeia de valor do extrativismo tradicional na região. “A D. Leonarda pediu para trabalhar com a gente, ela queria conhecer a máquina que quebrava mais coco do que ela. Depois dela, vieram também a Maria Francisca e a D. Raimunda”, comemora Márcia.
A adesão da comunidade aponta o potencial e possibilidades de mudança cultural, econômica e social do projeto da Apoena Bioindustrial. Há muita resistência à chegada de iniciativas que afetam a rotina, a tradição e o equilíbrio de forças dos moradores da região. É preciso conquistar a confiança da comunidade antes de implementar ações para abrir mercados ou gerar novos negócios. “Considero fundamental dar a elas a oportunidade de entender que o projeto é sério, e tem credibilidade e continuidade. Hoje elas falam ‘a nossa fábrica’. Meu maior orgulho é quando vejo que elas se sentem parte da iniciativa”, explica Márcia.
De solução tecnológica a negócio de impacto:
A Apoena chegou ao mercado há pouco mais de cinco anos, mas a trajetória da Márcia com o coco babaçu começou há mais de uma década, em um evento de gestão e capacitação de líderes em São Paulo. Ela assistiu a um vídeo sobre as mulheres quebradeiras de coco e ficou admirada com o esforço e a dedicação que empenhavam para a realização da tarefa. “Soube na ocasião que eram mais de 300 mil mulheres no âmbito da Amazônia Legal, vivendo da extração do fruto no país, e não podia acreditar. Aquilo não é habilidade, é necessidade”, comenta.
Administradora de empresas de formação, Márcia é filha de produtores rurais e acompanhou de perto a revolução causada pela chegada das máquinas e tecnologia ao campo. “Cresci no interior do Rio Grande do Sul, trabalhando desde cedo. Plantei e cortei muita soja manualmente. Aí veio a tecnologia. A chegada da máquina alterou tudo. Num curto espaço de tempo a qualidade de vida das pessoas mudou completamente”, afirma. Uma única colheitadeira realizava em poucas horas o que cinco ou seis pessoas levavam dias para concluir.
Motivada pela trajetória pessoal e pela experiência profissional adquirida ao longo da carreira, Márcia decidiu desenvolver e comercializar uma máquina capaz de quebrar o babaçu para extrair os ativos ambientais. O primeiro protótipo durou apenas três meses. A resistência do fruto é tão grande que quebrou o equipamento. O segundo modelo sobreviveu à força, mas não separou o coco de forma eficiente. A versão utilizada atualmente pela Apoena é a terceira geração do equipamento.
Em 2016, outra virada: Márcia foi ao interior do Piauí e do Maranhão para conhecer de perto a realidade socioeconômica das mulheres quebradeiras. Somente ali, in loco, ela entendeu que o desenvolvimento do maquinário não era suficiente para garantir a necessária mudança na dinâmica social no campo. Depois de algumas tentativas mal sucedidas de negociação com o setor público, ela finalmente decidiu montar um plano de negócios e criar a Apoena Bioindustrial, em 2019. Nascia aí a proposta de conjugar tecnologia e trabalho inclusivo para transformação social no âmbito da cadeia do coco babaçu.